terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

O que ainda não se pode comprar

(Uma visão triste nesses dias de carnaval: o desespero de quem não quer envelhecer, tem muito dinheiro, mas não pode comprar o tempo.)



Eu não saí de casa nestes dias de carnaval. O tempo passou, e a festa foi perdendo a graça pra mim. Acho que envelheci, graças a Deus!
Mas não fiquei alheia ao que aconteceu apesar de não querer saber o que aconteceu. E vi algumas coisas tristes cada vez que tentava ler um e-mail ou simplesmente me distrair na Net.
Eu vi o carnaval de alguns anos atrás se repetir em fotos de pessoas nuas. Sim, elas já não se vestem mais, e isto já faz um tempo. Vi o desespero de gente querendo perder a conta dos beijos que deu, mesmo que nesta contagem estivesse valendo beijar o desconhecido, o “qualquer um”. E vi gente que contou poder ir mais além, passar dos beijos – se é que me faço entender – com a mesma condição de isto valer com os desconhecidos.
Eu vi fotos de gente muito rica, muito famosa. E, ainda que esta gente encenasse um maravilhoso sorriso no rosto, tudo o que consegui ver foi tristeza.
As pessoas juntaram tanto dinheiro, e fizeram tanta coisa para tê-lo! E nessa guerra declarada para ficarem ricos esqueceram-se de um detalhezinho importante: o dinheiro não compra o minuto. Daí, o tempo passou, e hoje elas tentam esconder aquilo que de mais glorioso Deus nos deu: as marcas da vida.
No cenário carnavalesco, a exposição do corpo. Hoje é isto o que vale para os famosos em questão: e chega a ser ridículo homens e mulheres abastecendo-se de botox, silicone e purpurina em lugares estratégicos para aproximarem-se, aos quarenta anos, do que é um corpo de dezoito.
Elas sambam nervosamente, num balé desengonçado, sem o menor talento, fabricado nas academias. Um pé pra frente, outro pra trás. O cansaço, disfarçam com o sacudir dos braços. Não chegam nem perto das mulatas dos morros que andam por aí sambando a vida que têm que levar.
Eles fazem o mesmo: repetem a coreografia patética. Para disfarçar o dom que a natureza não lhes deu, usam ternos e calças largos. Ou sacodem um chapéu... Me dá pena ver!
As marcas da vida com que Deus planejou revelar a experiência e a sabedoria do homem têm que ser, obrigatoriamente, removidas. E as pessoas ricas e famosas se submetem aos cortes, aos riscos das cirurgias, na ilusão de que um rosto sem rugas é o tempo de volta.
Gastam o dinheiro que têm tentando comprar minutos.
Não se compram minutos.
A própria mídia que eleva, destrói. Aos quarenta anos, se está velho demais. As novelas “Malhação” e etc. esfregam a juventude na cara de quem já passou dos trinta anos e aguarda atendimento no consultório do cirurgião/milagreiro famoso. É preciso aparentar vinte, ainda que, para isto, todos e todas entrem na mesma fôrma e saiam de suas faixas pós cirúrgicas com a mesma expressão facial. Já se percebeu que todos na TV, depois de certo tempo, têm a mesma cara?
Nas escolas de samba, a ala das baianas é separada da ala mirim. É como se o tempo fosse respeitosamente dividido ali. E há até grande consideração pelas senhoras! Se viver fosse desfilar numa escola de samba, algumas pessoas teriam dificuldade em mudar de ala. Talvez os ricos e famosos arriscassem uma operação para parecerem crianças eternamente (?)... E a ala das baianas tivesse que ser exterminada...
Eu não sei o que será novidade para Antônio no corpo de uma mulher quando chegar a sua hora de interessar-se por isto. Talvez a curiosidade seja a de vê-la vestida. Não sei se quando chegar a vez dele, a medicina terá descoberto novas fórmulas e pílulas que estendam a juventude por mais tempo. Mas por enquanto vou ensaiando instigar nele a percepção do ser humano como Deus criou: em sua inteligência, bondade, caráter. E tento – ratifico, tento! – ensiná-lo a dar valor exatamente ao que ainda não se pode comprar. Porque acho que quando Deus permite ao homem envelhecer está abençoando-lhe. Quando lhe concede as rugas e lhe curva o corpo está presenteando-lhe com a certeza de que está vivo, porque quem não envelheceu morreu jovem, sem conhecer o melhor da vida.

5 comentários:

  1. Ao ler este trecho: "Eu vi o carnaval de alguns anos atrás se repetir em fotos de pessoas nuas. Sim, elas já não se vestem mais, e isto já faz um tempo", reportei-me ao último Carnaval que saí à rua, nos "festejos populares" em 2009. Já se vão 3 anos. Em 2010, viajei para passar o Carnaval na Canção Nova. Em 2011, fiquei a andar por nossa bela região, mas nem me arrisquei aos deleites noturnos, e agora em 2012, passei os dias de folga, praticamente em casa. Opção difícil até anos anteriores. Mas decisão tomada, após perceber que o carnaval que eu curtia, havia partido. O carnaval do tempo que as pessoas se vestiam para brincar. Que fantasia não era para esconder-se, nem provocar. Adotei a "doxa" "incomodados que se mudem" e mudei. Mas mudei desejosa que esta festa passe por um grande resgate. Confesso o incômodo que sinto, por uma certa covardia. Falta-me ainda, a coragem para ajudar nesse movimento de reconstrução. Quem sabe um dia eu consiga...

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  2. Quem sabe nosso texto ajude? Este, que postei. Este, que você compôs... Quem sabe um dia sintam falta de gente nas ruas nos dias de carnaval? Um bom boicote, hein? Quem sabe? Podemos começar a pensar nisto!

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  3. Feliz daquele que aprendeu a diferença entre o valor e o preço :da vida,dos bons sentimentos,da felicidade,da fé,das dores,do amor ágape!Linda reflexão,minha querida Karla!!

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  4. Nossa Cultura Infelizmente foi Banalizada! pela mídia que só prega Idiotice, e a idiotização da sociedade cega. Triste época onde coisa banais se tornaram normais;

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