domingo, 20 de maio de 2012

Saudade

(Este texto fiz sob encomenda. Uma amiga muito querida, Assiany, pediu-me que escrevesse sobre a saudade que sente de sua avó. Eu, como não vivi tão intensamente um amor como este, acabei me sentindo neta, também.)

Minha avó optou por ser minha mãe quando eu nasci. Dizem que ser avó é ser mãe duas vezes. Eu queria ter sido filha dela duas vezes, mas o tempo não deixou.
Todas as lembranças que carrego comigo de minha infância têm a ver com minha avó. Principalmente, as melhores: assistir à TV deitada no sofá, brincar à vontade e ser muito, muito bem cuidada...
Os obstáculos que minha mãe encontrou para tocar a sua vida após meu nascimento foram obras de Deus. Sem tempo para trabalhar e cuidar de mim restou-lhe, por felicidade – dela e minha, principalmente – entregar-me a vovó. Senhor, obrigada!
Que tempo maravilhoso! Que saudade!
Até então, eu não sabia que avós morriam. Caramba, ninguém havia me dito isto! E quando dei por mim, estava a despedir-me – tão rapidamente! – daquela que fora um dia tudo na minha vida. Vovó foi indo embora, levemente, sem me avisar. Eu, já adulta, porém eternamente neta, não quis ver, não quis perceber, e continuava a sugar-lhe as energias nos agora poucos instantes que restavam para nossa convivência.
Eu cresci entre os dias em que ela me levava para a escola e ia me buscar. Deixei suas mãos quando comecei a fazer sozinha o caminho da escola de ônibus, depois no meu próprio carro. Foi assim que cresci, com o tempo passando, sem dar-me conta. Ela também não atentou para o fato de eu ter – neste “curto” espaço de tempo – me tornado uma mulher. Sempre teimou em me chamar pelo apelido de criança. E esta era a parte que eu mais gostava!
Mas quando Deus nos empresta alguém, é por tempo determinado, Ele vem buscar depois. E foi assim que aconteceu: chegou a hora de vovó voltar para o céu, de onde veio emprestada por Deus, que já previra que um dia minha mãe precisaria ter um anjo ao lado quando sua filha nascesse.
Obrigada, meu Deus, pela vida da minha avó! E mais ainda, porque o Senhor a destinou para mim!
Nosso tempo de infância passa rápido. Não é suficiente para entendermos os sentimentos. A gente não percebe quando ama alguém de verdade, tampouco a intensidade desse amor. Só sente que ama. Mas acredita que as pessoas são eternas, ninguém explica muito bem essas coisas de morte para as crianças, e não sei se as crianças entendem bem o que acontece.
Sei que minha infância passou num lampejo e todos os dias sinto saudades do meu tempo de criança, porque sinto saudades da minha avó.
Antes de ela ir embora passeamos de carro algumas vezes. Eu dirigindo, ela ao meu lado, assustada, temerosa como se desse o volante àquela pequenininha que ajudou a crescer. Vovó não me viu adulta. Enxergou-me sempre como criança, como que tivesse congelado a figura que dela se despediu quando deixou sua casa para morar em outra cidade. Eu, mulher feita, aos olhos azuis dela, uma menina. Sempre me viu com os olhos do coração. Que neto cresce?
Durante os passeios, pouco reconhecia seu bairro. Às vezes era necessário que eu lhe dissesse onde estávamos, embora bem próximos de sua casa. Às vezes, quando conversava, eu lhe completava as frases que ficavam perdidas em seus pensamentos. Às vezes eu lhe ajudava a reconhecer pessoas, ainda que fossem parentes bem próximos. E nada, nenhum desses sinais, preparou-me para ver vovó partir.
Hoje eu vivo a vida, porque ela não para pra eu chorar minha saudade. Nunca mais fui à casa onde passei meus melhores anos. Não penso na dor. Tento imaginar que estou distante somente por questões geográficas, que ela ainda mora no mesmo local. Depois “cai a ficha” e fico inventando pretextos para me convencer de que as coisas são assim, mesmo.
Sinto muita saudade! E temo não ter podido ser filha duas vezes pra ela. Fecho os olhos, me recordo dos nossos dias, pedindo perdão a Deus se a magoei algum dia ou por algum motivo. Mas, pelo que lembro de nossa convivência, Deus me diz que não. Porque só lembro de seu sorriso amarelado, seus olhinhos azuis, simpáticos, me permitindo viver.
Avós permitem que netos vivam. Eis o seu segredo! E hoje eu vivo, graças a minha avó!

4 comentários:

  1. Realmente emocionada,minha vó Diva completou essa semana 80 primaveras,e eu aqui longe.Na casa da Vó Diva podíamos tudo,subir em árvores,correr,brincar como meninos...nostalgia gostosa,parabéns...se sua inspiração quiser...escreva por favor algo sobre a Inclusão...bjus carinhosos e admirações

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  2. Obrigada pelo carinho de sempre, Aretha! Feliz de quem teve essa bela experiência com avós...
    Quanto à inclusão, minha cabeça dá voltas e meus dedos coçam... Hummmmmm, acho que não tarda a postagem por aqui. Fique de olho! Rs. Bjs.

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  3. Me emocionei com as palavras com as quais você procura demonstrar com suas palavras a importância de uma vó. Lembrei-me da minha, quantas vezes chorei em seu colo e ela com a humildade e simplicidade de passar o seu carinho e amor, como eu me sentia feliz e ainda me sinto. Por várias vezes me fez acreditar que tudo era belo! Amo muito minha vó, e o que mais me chamou atenção foi quando você Karla escreveu a seguinte frase:" Mas quando Deus nos empresta alguém, é por tempo determinado."
    Nada nos pertence nesta vida, Deus apenas nos empresta ombros amigos, pessoas que surgem em nossas vidas em momentos de angústia ou até mesmo para compartilhar a nossa alegria. Devemos compreender que para tudo há um tempo determinado, mesmo estando distantes de pessoas as quais amamos muito, temos que aceitar e apenas guardar as lembranças porque essas são eternas!

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    1. É, minha Débora querida... Importa que vivamos o momento presente e que procuremos valorizar as pessoas que amamos. Concordo com vc!

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