quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Carta para Madalena

"Não vejo mais você faz tanto tempo
Que vontade que sinto
De olhar em seus olhos, ganhar seus abraços
É verdade, eu não minto"...
Minha querida amiga, num dia como o de hoje você nasceu. Que pena não poder tê-la agora por perto para abraçá-la...
Há seis anos sinto por não ter você por perto. E hoje resolvi vir até aqui – meu espaço preferido! – para escrever-lhe esta carta. Espero que os anjos a leiam e a repassem para você.
Todos os dias ouvimos, em diversas situações, aquela máxima de que Deus nos fecha uma porta e nos abre janelas. Antônio nasceu em fevereiro do ano que eu imaginava ser o mais feliz da minha vida. E, no entanto, o ano de 2006 deu-me Antônio, mas levou você de mim...
Sim, certamente a dor seria muito maior se eu não tivesse a companhia de Antônio, dia-noite-dia, naqueles seus primeiros meses de vida, a ocupar-me as lembranças... As tantas fraldas, os ensaios de papinhas dividiram espaço com a saudade que senti de você, todos os dias da minha vida, desde que você se foi.
Madalena, eu ainda me lembro do dia em que recebi de Herminia o comunicado de sua morte: com meu filho nos braços, voltando de um passeio de carrinho, me preparando para amamentá-lo, fui pega de surpresa por um telefonema que me tirou o chão. Do outro lado, uma Herminia que também nunca mais seria a mesma dava-me conta de que você não estava mais aqui. Meu silêncio fez com que Herminia me chamasse várias vezes. Ainda ouço a voz dela ao telefone: “Karla, Karla!”, num desespero compartilhado de alguém que não sabe o que pensar diante da pior notícia que se quer receber. Aí, foi o mundo se acabando, o chão sumindo, as pernas balançando e eu procurei um lugar para me sentar. Antônio, aflito, parecia saber o que se passava, e aqueles olhinhos de jabuticaba arregalados acompanharam meu choro: eu nunca havia me sentido tão só.
Sei o que me fez sofrer em demasia quando da notícia desgraçada: um telefonema seu, que eu não atendera dias atrás. E vou lhe contar minha dor, Madá, para ver se consigo descansar este meu coração...
Dois dias atrás do Tsunami (foi o que me pareceu, ver você ir embora) recebi uma ligação sua. Como estava amamentando Antônio, e ele estava quase dormindo, resolvi não atender e retornar assim que o pusesse no berço. Pois bem, ele dormiu, e ao repetir a rotina mecânica dos meus dias, esqueci de ligar pra você.
Talvez um dia algo aconteça que faça sair do meu peito essa angústia que carrego de não saber o que conversaríamos naquela tarde... Será que você me pediria ajuda? Será que me confidenciaria um segredo, uma preocupação? Será que se despediria, mesmo sem saber?
Ah, Madá, que falta você faz na minha vida! Sei que devo agradecer a Deus diariamente por ter feito com que nos conhecêssemos, nos tornássemos amigas, mas hoje minha carta tem o propósito de expurgar essa dor que me acordou por várias noites à época de sua partida, e que ainda me acorda, basta que eu me lembre de você...
Algumas coisas diferentes foram aparecendo na minha vida, Madalena, e nem pudemos compartilhar! A despeito dos seus conselhos para que eu mudasse de profissão, que investisse minha inteligência e minha coragem em uma profissão que me desse melhores condições de futuro, continuei na labuta de Inspetor Escolar. Se você soubesse das minhas últimas estadas sei que ficaria orgulhosa, apesar de continuar me aconselhando a “sair disto”.
Antônio cresceu tanto, já passou de um metro e trinta! Se pudesse abraçá-la agora facilmente a alcançaria! Ele gostava tanto de você!... Graças a Deus não chegou a doer no seu coraçãozinho de criança a sua falta. Está com seis anos, já lê e escreve tudo! Letrinha muito desenhada, graças aos treinos no caderno de caligrafia. É, aquele mesmo caderno responsável pela sua letra tão perfeita, também,!... Apaixonou-se por uma menina linda chamada Eduarda, Madalena, e eu, ando morrendo de ciúmes dessa paixão.
Parece que agora ouço sua risada, Madá... Graças a Deus fiz você rir bastante, não é? Trago este orgulho no peito. Não tenho dúvidas: foram dias maravilhosos, ora trabalhando nas escolas em companhia de Herminia – quanta risada! – ora em reuniões com Nilza e Cláudia, ora nos momentos de almoço, no carro, nas caronas que, como você bem dizia, “não tinham destino nem horário a cumprir”...
Muita, muita saudade, minha amiga.
Pela primeira vez meus dedos ansiosos teclam as palavras antes de eu pensar. Vendo-as na tela, me emociono. Queria escrever algo que deixasse você orgulhosa de mim, mas acho que estou me perdendo num amontoado de letras que só estão se perfilando aqui para, na verdade, pedirem perdão a você, em meu nome.
Perdoe-me, Madalena, por não ter-lhe atendido aquela tarde. Eu não sei o que você iria me dizer, levarei até o fim da vida esta minha dúvida, mas espero que daí do céu – aquele que imagino, com homens, bichos e plantas – você possa ter tido a certeza do quanto foi importante pra mim, de como aprendi a amar você, e do quanto sua presença fez e ainda faz falta.
As fotos acompanhando o crescimento de Antônio foram interrompidas naquele dia em que você sentou-se na cadeira do hospital e faleceu, depois da alta médica diante de uma aferição de pressão normal. Antônio ficou só, nas fotos. Nunca mais o colo da Tia Madá...
Nunca mais a mesma Karla. No entanto, agora, uma Karla melhor, posto que ter convivido com você durante seis anos me fez melhorar a pessoa que sou, a cada dia.
Se era este o propósito de Deus, obrigada, Senhor! Porque teve gente que nem chegou a conhecer você, Madalena, e não sabe o que perdeu! E teve gente que, ainda que a tenha conhecido, não soube aproveitar-se dos ensinamentos que se traduziam na simples presença daquela senhorinha pequena, humilde, tímida...
Eu aproveitei. Curti o que pude. Sei que tornei seus dias mais felizes, também.
Quanto ao resto, fica o pedido de perdão. Meu choro agora me chega como cura. Espero estar sendo abençoada por Deus.
Fique em paz, minha amiga querida, única, insubstituível. Neste dia do seu aniversário, recebe meu abraço em forma de oração. Que o Senhor a guarde em descanso merecido. Sou metade sem você.

"Agora que faço eu da vida sem você?
Você não me ensinou a te esquecer
Você só me ensinou a te querer"...

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