sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Criança

(Taí mais um texto, meio que encomendado... Como tem tudo a ver com o dia de hoje, resolvi postar logo.)

Criança é tudo!
É uma pena só nos darmos conta disto quando envelhecemos... Sim, as frases feitas, ensinamentos sobre como curtir a infância são elaboradas pelos adultos. Nada mais podemos fazer, porque criança é, sempre, o outro, alguém que não nós...
Ontem conversei com uns amigos sobre um cheiro que senti repentinamente, ao abrir a janela da minha sala de trabalho. Tratava-se do cheiro da minha infância: acontece que passei dias de férias e feriados prolongados aqui em Iguaba Grande quando era muito pequena e, de repente, não sei de onde, aquele cheiro das chaves da casa que o amigo do meu pai emprestava para que pudéssemos vir preencheu os espaços do meu gabinete e do meu coração no mesmo instante em que abri a janela. Ele veio junto com o vento que soprava do litoral. E, por segundos, vi a mão preta de papai (suja de graxa) balançando as chaves ao chegar em casa, numa atitude simples, mas que dizia tanta coisa para as crianças! Senti a mesma alegria, e meu sorriso, na janela da sala, teve oito ou nove anos por uns instantes...
Criança é isto. Para papai, uma viagem a fazer com seu fusquinha 68: verificar o estado do carro para garantir segurança, compras no mercado, um dinheirinho a mais para os gastos extras... Para mamãe, as compras dos biquínis novos, a arrumação das malas, as roupas a mais para lavar depois, na volta...
Mas para a criança, ah, para mim, a felicidade, a felicidade!!! Escolher os brinquedos para levar, contar os dias em que ficaríamos por lá, pensar na praia, nas voltas de bicicleta, nas corridas com Sheike...
E quando os dias acabavam e chegava a hora de voltar pra casa? Ah, aquele sentimento de tristeza, de saudade, misturados com a alegria de rever o que havia sido deixado em São Gonçalo... Aquela dor da ida acabava em pouquíssimo tempo, bastava que papai falasse em quantos minutos estaríamos em casa novamente.
Adultos não são mais crianças, infelizmente. Esta demarcação é outra obra magnífica de Deus. Quando a criança cresce, perde a graça, e é por isto que os adultos são tristes... Mas existe um segredo, que poucos conhecem: deixar-se crescer é opção de cada um.
Aqui em casa eu parei de crescer já faz tempo. Desde que cheguei à adolescência, graças a Deus. Porque com dezesseis anos comecei a trabalhar e minha profissão de Professora não me permitiu dar vez ao adulto que queria se apoderar de mim. Conviver com crianças é fabuloso, é rejuvenescedor! E optei por ficar por ali mesmo, com elas... Fui ficando – e gostando de ficar! – e foi assim que, ao chegar aos trinta e sete anos, Deus, já percebendo que o adulto se fortalecia e se preparava para o ataque de posse, deu-me Antônio de presente. E agora, há seis anos sou criança.
Faço questão de ser assim. Não me incomodo com as marcas que o tempo teima em imprimir no meu corpo. Eu sei, tenho rugas a mais, cabelos brancos insistentes, celulites, varizes, neurônios a menos que me confundem muito às vezes, e minha imagem no espelho reflete e ratifica a existência da relação entre a lei da gravidade e a idade que se tem... Mas, sinceramente – e quem me conhece de verdade sabe – não ligo muito para isto. Porque todas as vezes em que travo uma luta com Antônio e nesta luta sou a Mulher Maravilha vou com ele até o final. Umas vezes venço, noutras sou derrotada pelo Homem de Ferro ou pelo Diamante, e em inúmeras outras nos esquecemos da luta para cobrirmos um ao outro de cócegas! Quem se arriscaria a dizer que não sou criança?
Carrego uma criança em mim. Alimento-a diariamente. O Sol que me cumprimenta pela manhã recarrega a bateria daquela que será a companheira de Antônio durante o dia, a tarde, a noite, até que a bateria dele se esgote num sono profundo abraçado ao “Chaves”...
Não faço questão de crescer. Quero esperar por ele. Assim, minha menina me ajuda a dizer “não” quando é preciso, a ser honesta na relação com meus amigos, a sorrir quando estou contente, a chorar quando estou triste, a dizer a verdade acima de tudo, a brincar, a tirar fotos de sombras... Faço, hoje, tudo o que Antônio faz, também. Assim, vou recebendo de Deus as graças que ele destina às crianças. Respinga um pouco em mim, e delas sobrevivo.
Crianças são seres abençoados! Crianças são a aposta de Deus no coração do homem. São a nossa certeza de que há chance de as coisas ficarem melhores do que estão. Todos os dias quando confiro Antônio ao buscá-lo na escola agradeço a Deus por ter nos braços aquele mesmo menino de quem me despedi quando lá o deixei. Eu espero que Antônio saiba aproveitar seu tempo de criança, para aprender a carregá-lo consigo quando chegar a hora de encarar a adolescência. Por aqui, fico rezando. Ele já faz sua parte, é um menino e tanto, com todos os direitos a ser feliz que lhe são reservados! E, se tornar-se um adulto com rugas, varizes, cabelos brancos, e mesmo assim mantiver-se revestido da criança que hoje é, só terei a agradecer, a louvar a Deus por ver meus pedidos – tantos! – atendidos por Ele!

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