domingo, 4 de março de 2012

O retrato

(Eu troquei a foto do perfil e encontrei-me no retrato da minha mãe. Aí, deu texto.)


Eu mudei minha foto do perfil do facebook. Sugestão de minha amiga Ordelina, em protesto contra a violência que as mulheres vêm sofrendo ao longo dos anos.
Escolhi uma foto da minha mãe para postar lá. E o fiz. Mas a simples ação de abrir o retrato na tela do computador e observá-la emocionou-me demais!
Estou lá, no rosto da minha mãe: os cabelos cacheados, curtos. Os dentes irregulares – muitos, para o tamanho da boca! - o sorriso de canto, as sobrancelhas, os olhos bem afastados um do outro, o rosto redondo...
Quando minha mãe tirou este retrato era bem mais nova do que sou agora, é certo. O lápis da vida já fez alguns contornos em mim que ela ainda não traz na foto.
Tentei achar minha mãe de setenta e dois anos lá naquela imagem. E encontrei um futuro naquele passado da foto. Orgulhe-se, mocinha, Dona Vanda sobreviveu!
Que magia é esta a da genética? Como Deus é sábio! Estou lá na foto da minha mãe e, se procurar direitinho, encontro Antônio também. No olhar. Sim, ele está bem no olhar da minha mãe...
Ver o retrato aumentou minhas saudades. A saudade da mãe que não vejo há alguns dias, e a saudade desse tempo dela que passou. O viço, o rubor, a alegria e - ouso identificar no retrato também - a esperança, a fome de viver!
Passei por aqui para compartilhar este sentimento esquisito de ter o passado eternizado numa fotografia. Hoje, pelo visto, Deus reservou para mim um comovente (re)encontro comigo mesma: estou a garimpar meus ex-alunos no facebook e, enquanto o cursor me pede para aguardar, espero, com minha memória afetiva, ver o retrato de um menininho ou de uma menininha aparecer diante de mim. Mas o que há quando a tela abre são homens e mulheres libertos, felizes, adultos, donos de si. Cadê aquela criançada? Se eu quiser encontrá-la, terei que olhar pros retratos...
Deus criou o tempo e deu ao homem inteligência para criar a máquina fotográfica. Agora passado, presente e futuro estão todos ali. No mural com retratos que tenho aqui em casa, conto a evolução de Antônio: ele está na minha barriga na primeira foto. E com seis anos na última. Entre uma foto e outra, alguns tios que já faleceram. Eu deixo tudo lá, pra Antônio não se esquecer da sua família...
Há uma nostalgia fazendo-me companhia hoje. Graças a Deus! Vontade de ilustrar este texto com os retratos que tenho aqui em casa. Da menina que fui, do meu sobrinho quando nasceu, de Antônio quando começou a andar, dos meus pais na Lua-de-mel... Eu tiro milhões de fotos, quase como se quisesse que o tempo não passasse. Melhor pra Antônio, quando quiser contar a história para os meus netos.
Tenho um retrato de um pôr-do-sol na minha rua que jamais se repetirá. Porque a casa que fazia fundo pro cenário não tem mais as árvores que multiplicavam os raios amarelos na fumaça cinza. É isto: alguém havia posto fogo no lixo numa esquina, a fumaça atravessou os raios do sol e, daquele balé, surgiu a foto. Passei bem na hora, e não perdi a oportunidade.
Todas as vezes que vou a São Gonçalo saio de lá com a máquina carregada de fotos dos meus pais. Hoje Sr Walter está com setenta e sete anos e Dona Vanda com setenta e dois. Mas posam como se fosse foto de lambe-lambe. Respeito à foto. Postura ereta. Uma graça! Estarão eternos lá. No retrato e no meu coração.

6 comentários:

  1. Karla, vc tem o dom de escrever e o dom de nos emocionar!!! Que texto lindo!!! Que facilidade vc tem em expressar tudo aquilo que sentimos e não conseguimos colocar no papel!!! Parabéns!!! Deus a abençoe cada vez mais!!!

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  2. Amiga que texto lindo,acabei chorando com essa história tão linda que vc relata!!
    Vc nasceu para escrever e emocionar a todos,um grande beijo...

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  3. Parabéns pelo texto! Eu dou a mesma importância a este mágico poder de determos o tempo...Amo fotografias.
    Abraço.

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