segunda-feira, 18 de março de 2013

A dor de Márcia

( A morte é certa e, no entanto, é sempre uma surpresa. Que a dor de Márcia nos ensine a amar e a demonstrar o amor que sentimos enquanto há vida.)


Todo mundo está sofrendo junto com ela. Sofreu com ela no período em que ele esteve bem doente, sofreu com ela quando Deus resolveu vir buscá-lo de volta e, agora, sofre com ela a dor da saudade.

Ninguém tem a palavra certa para lhe dizer. Gasto o vocabulário, só o que Márcia faz depois de ler as mensagens que lhe chegam – virtuais ou não – é chorar e doer. Ninguém ainda lhe disse a palavra mágica. Assim, ela vai expurgando a ferida com seus desabafos, enquanto a gente vai tentando consultar o Google para descobrir o que faça Márcia entender o que aconteceu, e conformar-se. E, se não for pedir demais, sorrir de novo – ela tem um sorriso lindo! – e ser feliz.

Cada um dos seus amigos tem uma religião diferente, acredita num Deus diferente. Isto para mim não interfere em nada, porque foi um “Deus de todo mundo” que curou Herminia (eu já contei há uns textos atrás), então, os amigos de Márcia recorrem às certezas de Deus e escrevem linhas e mais linhas para consolá-la. Deus é bom, Deus é fiel, Deus conforta, Deus abençoa...

E cada vez que ela experimenta a presença de Deus ao seu lado, tudo o que sente é uma saudade enorme, que hoje se chama Juninho.

Márcia e Juninho tiveram uma filha, a Carol, que hoje tem cinco anos de idade. Eu, de fora, fico observando a família pelas fotos que ela compartilha, e olhando para Antônio, que agora está com sete. Eu não vivo com o pai dele, daí fiquei pensando nisto tudo e resolvi escrever.

A certeza é a morte, não a vida. Depois que nascemos, só nos resta saber que um dia partiremos deste mundo, onde Deus nos colocou para sermos felizes, fazermos o bem e garantirmos presença no céu, quando Ele vier nos buscar.

Daí, para que a felicidade seja maior ainda – a gente sempre quer mais e mais! – vamos, ao longo da vida, conquistando amigos, vamos nos apaixonando, vamos construindo família.

Num desses encontros de destino/coração, Márcia conheceu Juninho.  Eles se apaixonaram e se casaram. Tempos depois nasceu Carol e a vida não podia estar melhor naquela família.

Parece um pouco comum, não? Um pouco lógico, ou evidente demais? Pois foi justamente aí que me peguei pensando: no nosso prazo de validade...

Há três anos uma amiga me revelou que seus médicos haviam lhe dado seis meses de vida. E ela mesma espantou-se quando eu lhe disse: “Que bom! Pelo menos você sabe que terá seis meses para viver. Eu não sei se os terei. Quem sabe que os tem?” Depois de pensar no que ouvira, ela sorriu e concordou comigo. Hoje ela está curada e... VIVA!

Eu me atropelei nas palavras cada vez que quis dizer alguma coisa que acalentasse o coração de Márcia. Nunca consegui. Depois de escrever e ler o que escrevi, ficava até mais triste do que ela.

Nada há que se diga. Nem que o tempo curará suas feridas, abrandará sua dor. Porque tem gente que chora longos anos a saudade de um filho, de um marido, de um pai...

Então, minha tentativa de hoje é de escrever sobre o valor que se dá à vida e aos que estão vivos ao nosso redor. Carol ficou, e agora depende de Márcia para entender o que aconteceu, depende de Márcia para crescer bem, depende de Márcia para viver, para ser feliz agora, apesar de tudo, porque é só uma criança, e tem todos os direitos de ser feliz.

Como está a sua vida hoje, leitor? Tem dado valor ao simples fato de abrir os olhos pela manhã? Já pensou alguma vez na vida no fato de que nem todos podem abrir os olhos pela manhã? De que nem todos que abrem os olhos pela manhã enxergam o dia lá fora? Pare pra pensar no valor que Juninho dava a cada manhã que lhe era concedida a graça de abrir os olhos...

Casais que brigaram ontem à noite e acordaram zangados, mal se cumprimentaram e saíram para seus destinos, nem se deram conta da futilidade do motivo da desavença. Qualquer coisa é fútil demais quando se pensa que, no final do dia um ou outro pode não chegar a casa...

Eu poderia escrever aqui sobre as discussões cotidianas entre irmãos, as discordâncias entre pais e filhos, os rompantes entre os melhores amigos da escola, mas Márcia chora a perda do seu amor. Ele se chamava Juninho e era o seu marido.

Muitos são meus pensamentos, e só terminarei meu texto se Deus quiser. Você só lerá se estiver vivo para isto. Logo quando comecei a escrever este texto soube da morte de um rapaz aqui da cidade. Um Juninho. Um pai de família. O amor de alguém.

Talvez fôssemos pessoas melhores se pensássemos todos os dias, todas as horas de nossas vidas, que a pessoa a quem amamos – a quem entregamos o nosso coração – pode ir-se embora, ter com Deus. Mas preferimos não pensar nisto e, então, levados pela rotina do mundo (este inimigo da vida!), deixamos para fazer as pazes “logo mais”, ou “amanhã”, ou – pior! – quando formos procurados para isto.

Ah, orgulho! Este sentimento que chegou até o nosso coração há tanto tempo! Somos orgulhosos desde que o fruto proibido foi provado. E nos distanciamos das pessoas, nos traímos, envergonhamos a Deus.

Márcia, minha querida, talvez a certeza de que tenha feito sua parte enquanto Juninho esteve com você traga leveza ao seu coração. Talvez pensar que casamentos podem ser salvos daqui em diante, por conta de sua viuvez lhe traga bons sentimentos. Falo por mim, que se hoje estivesse ao lado de alguém pensaria duas, três, milhões de vezes antes de criar situações de conflito. Pelo menos você sabe que seu marido foi em paz. Sabe que deixou aqui na Terra uma família linda, com “duas meninas” lindas, que se sustentarão uma a outra, e se fortalecerão na dor.

Jesus não foi o único a morrer para que aprendêssemos com a morte. Cada vez que um filho de Deus se vai surge a chance de tentarmos ser melhores. Eduardo faleceu esta madrugada. Infarto fulminante. Um menino! Temos o dia pela frente. A chuva – tão desejada nestes dias de calor! – leva maridos e esposas em Petrópolis. Sonhos de possíveis casamentos se encerraram naquela noite em Santa Maria. E a vida continua.

Precisamos amar mais. E demonstrar nosso amor, sem ter medo ou vergonha. Precisamos ter mais tempo para dedicar a quem amamos. Só o amor cura as dores. Só saber que amou e foi amada acalma o coração de Márcia. Só saber que é amada por Márcia acalmará o coração de Carol. Eis o maior dos Mandamentos! Urge que o coloquemos em prática, verdadeiramente.

A dor de Márcia é minha também. E por não ter por quem chorar, era isto o que eu queria escrever.

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