sábado, 8 de dezembro de 2012

Encomenda de vida

(Eu não saberia viver encomendando meus atos. Eu vivo: lanço-me. Sou entrega radical á paixão de VIVER!)


Deixei pelo rastro de rosas do meu caminho muitas pessoas jogadas pelo chão. Não volto atrás. Não as vejo. Sigo.

Deus me ensinou a enxergar o coração das pessoas. Já não me surpreendo tanto quanto antes. Aos quinze anos, enchia o travesseiro com lágrimas por uma decepção. Hoje, não mais: respiro fundo, e tudo o que sai do meu coração é um “obrigada, Senhor!”...

Já faz um tempo que percebo que estou me construindo e, que pela minha idade, já entrei na fase do acabamento. E, justamente por isto, estou muito mais exigente: quero material de primeira, quero garantir meu futuro.

Tornei-me uma pessoa diferente, nestes tempos de construção. Usei artigos que não se usa mais, alicercei demais uns ideais que agora tomaram corpo dentro de mim, e não sei mais viver sem eles. Rubem Alves falaria que construí um jequitibá no lugar de um eucalipto. Mas como sei que ele ficaria feliz por isto, fico também: eis que sou jequitibá, enquanto eucaliptos me rodeiam.

Sou inteira. Radical. Direta. Muitos temem essas características (eu pensei em escrever “qualidades”). Mas elas estão lá, concretadas na minha base, vêm se solidificando há quarenta e quatro anos, inútil querer mudar.

Ontem recebi um conselho daqueles que chegam até nossos ouvidos como “crítica construtiva”. Eu não acredito em crítica construtiva, quem bem me conhece, sabe. Em nenhuma situação. “Crítica construtiva” é, para mim, mais uma das expressões ridículas que ouvimos em reuniões de Conselho de Classe. Eu abomino as reuniões de Conselho de Classe. Abomino, então, o que se chama por aí de “crítica construtiva”.

Mas eu dediquei alguns segundos a ouvir o tal do conselho, e tudo o que pensei foi: “preciso dizer para todo mundo que não sou uma encomenda de vida”...

Há gente que encomenda a própria vida.

Encomendar a própria vida é submeter-se aos julgamentos dos outros. Inclusive aos prévios. É esperar ouvir dos outros o que se deve fazer, que caminho tomar. Passa por bem longe de mim a ideia de ter que esperar pela opinião de alguém para ser eu mesma. Isto é uma encomenda, não é uma vida.

Eu vivo. E tem gente à beça que não sabe o que está perdendo por não querer arriscar viver ao meu lado. Uma gente que, temerosa, se afasta e – ainda pior! – aconselha a quem está por perto a fazer o mesmo.

Talvez eu preferisse a morte a ter que perguntar antes sobre o que fazer. Eu faço, e dou-me o direito de arrepender-me depois, quando é o caso. Isto acontece pouco, até, pelo jeito que, tendo assentado minhas “sapatas”, minhas colunas se ergueram...

Hoje abro caminhos, furacão enlouquecido – mas são! – entregue às paixões de amar viver: carrego comigo umas verdades que me sustentam, cato amigos, parceiros, para seguir adiante, porque acredito que a vida é nada sem que se tenha amigos para compartilhá-la. Dos que tentam me ludibriar me desfaço, ficam pelo chão, largados, sentindo ainda um pouco do perfume de rosas que deixo, mesmo sem que mereçam. E gente deste tipo fica rastejando, sem dar-se conta de que já sumiu da minha vida. E não fazem a menor falta.

Lanço-me ao novo, ao inesperado. Gosto disto. Gosto de acreditar no que penso, no que faço. Às vezes me confundo com meus sonhos, porque acredito neles. E sonho, e vou, e levanto-me ainda mais forte cada vez que tropeço. Porque faço questão de dar valor à vida que em junho de sessenta e oito Deus resolveu me conceder. A luz me recebeu, eu não posso ser o escuro.

Gosto de iluminar. Tem gente que gosta do meu sorriso. Tenho infinitos dentes, que se atropelam, se entortam, mas que estão lá, fiéis, a adornarem-me a boca, pra eu poder ser feliz. Não gosto de sorrisos contidos. Gosto dos meus dentes, assim mesmo, porque gosto de rir. Eu rio de tudo, graças a Deus! E gosto de ver gente rindo ao meu lado, gente rindo por mim, de mim, para mim. Não tolero cara feia, rosto sisudo, mau humor. Isto, a vida nos dá de graça (assim, com essa redundância, mesmo). O mundo – este que não é de Deus – ocupa-se disto: de nos mostrar as caras feias das gentes de todos os dias. Repreendo. Entrego nas mãos do meu Senhor. Que me venha a alegria! Amo viver!

Tudo o que perco, fica fora da minha vida, porque creio num Deus que me define o joio antes que ele cresça demais a minha volta. Simples assim: “Saiu? Oh, Glória! Vá com Deus!” Foi assim com meus tão poucos relacionamentos afetivos, com alguns amiguinhos de infância... Não mudou nada.

Um dia novo na janela rompe meus olhos. A janela do meu quarto ainda está quebrada, e eu não vou consertar. Porque amo sentir o Sol atravessando meus cílios! Ele brinca comigo, eu reclamo um pouco, mas logo, logo estou de pé a abrir-lhe a janela inteira para que entre em meu quarto e invada tudo! Aí, ele fica todo bobo e compõe minha casa: é a alegria da vida, a energia da vida, a mola mestra! Sem ele nada há, eu já falei muitas vezes sobre meu amor pelo astro-rei!

Como Sol vivo a vida: saio feliz de casa para trabalhar, observo a rua, os cachorros, os vizinhos, as amendoeiras, os pescadores, todos com a mesma importância, e é quase um louvor! Um ritual de respeito à vida que cada um ganhou pra si, com o mesmo amor de Deus.

Respeito a vida. Entrego-me. Cuido dos limites para que ninguém atravesse a minha, tampouco eu a de ninguém. Parei o carro, dia desses, para que uma cobra enorme atravessasse a rua. Não tenho o menor direito sobre a vida daquele animal que, sem sombra de dúvida, é mais belo que eu: uma cobra linda, enorme, imponente, que em nada atrapalhou o meu caminho. Só quis seguir o seu.

Não faço encomendas. Vivo o que vier. E vivo plenamente, faço questão! Sofro todas as consequências, mas assumo todos os meus atos. Sou “do bem”, não desejo nem faço mal a ninguém. Não falo mentiras, não iludo pessoas, não prometo o que não posso cumprir. E desconheço o motivo pelo qual certas pessoas alimentam tanto ódio, tanto sentimento ruim em relação à vida que optei viver. Ela é minha, de mais ninguém. Responderei por tudo o que fizer de errado por aqui, e sei bem disto. Só não quero ser um ensaio de alguém que não viveu. Porque quem ensaia não vive. Para isto, vou tentando, vou vivendo. Sem encomendas.

A construção nunca acaba...

Seja o que Deus quiser!

2 comentários: