sábado, 23 de março de 2013

Quanto custa viver?

(Tendo chegado à metade da vida, ando refletindo sobre o que realmente importa...)



Antônio está na praia, neste momento. Seu pai o levou. Trouxe para buscá-lo, um amiguinho. O menino escondeu-se no carro. E até agora está na minha memória o sorriso do meu filho ao ver o amigo surgir na janela.

Eu fiquei no portão até perder o carro de vista. Os dois no banco de trás, brincando, felizes, felizes!

Tenho estado pouco com Antônio. Trabalhando demais. E, por estar certa de que não sou a única, quis escrever uma pergunta que ando fazendo a mim mesma. Eu me faço perguntas demais, não consigo responder a todas. Quanto custa viver?

Estou na metade da vida. E confesso que é verdadeira aquela história de que quando se chega aos quarenta anos quer-se ter os dezoito de volta. Mas não os dezoito do viço. Os dezoito do futuro mais distante, da morte quase impossível.

Ontem soube da morte de Talita, uma pessoa que quando conheci só pude concluir uma coisa a respeito: amava viver. E aí fiquei pensando em como Talita deve ter ido embora insatisfeita! Mas ela já vivia seus oitenta anos, daí o desejo de prender-se à vida que se despedia dela.

Hoje deve ser o dia mais feliz da vida de Antônio. Crianças têm isto de bom, todos os dias são seus melhores dias. Crianças não planejam muito o amanhã, tampouco choram pelo ontem como os adultos. Crianças amam o dia de hoje. Antônio abriu as janelas do seu quarto e me disse que o dia estava lindo lá fora, enquanto eu abria as da sala e supunha que iria chover. Meu filho – Deus menino – é o meu otimismo, quando a vida me obriga a entristecer. Isto foi há algumas horas atrás. Olhando para o céu agora, vejo que o dia de Antônio venceu a batalha contra o meu, graças a Deus!

Eles estão por aqui por perto, mesmo. Na lagoa. Disseram que vão comer um churrasco num quiosque. Antônio saiu coberto de filtro solar, com um boné na cabeça e uma bola embaixo do braço. Eis o preço do dia mais feliz da sua vida...

Enquanto meu menino se diverte às custas de uns picolés e de um churrasquinho de beira de lagoa, eu aproveito o silêncio de casa para fazer as contas das despesas. Preciso saber se o dinheiro que tenho durará até o fim do mês. Preciso saber se conseguirei pagar as contas de luz e água antes do corte. Preciso renegociar a dívida do cartão de crédito, cuja fatura já venceu e eu não tive condições de pagar. Preciso ver se a quantidade de ração que há no pacote alimentará as cadelinhas até a semana que vem. Preciso de informações junto ao RH sobre a data do pagamento, para saber se vai dar para comprar o ovo de Páscoa “dos Thundercats”, que Antônio tanto quer! Pretendo passar o feriado em São Gonçalo, vou precisar ter dinheiro para o combustível e para os pedágios...

Às vezes – em muitas das vezes! – desisto de continuar. Papéis sobre a mesa da sala, calculadora, anotações, boletos bancários, carnê do carro, caneta, tudo aquilo misturado me dá sono. As contas não se encaixam, não cabem no total que acusa o saldo da conta corrente, e eu nunca sei como fazer. Junto tudo, guardo na gavetinha da cozinha e deito para dormir.

Lá fora me exigem comprar a bolsa e o sapato de marca. Exigem que eu não tenha cabelos brancos, muito menos crespos. Exigem que meu manequim seja trinta e oito. Lá fora eu não posso ter barriga protuberante, nem estrias, nem celulites. Não posso ter cravos nem espinhas, e tenho que me lembrar, quando vou à manicure, de que um dos dedos tem que ter a unha pintada numa cor diferente das demais. Quando me esqueço de alertar para este detalhe fico me punindo e, na rua, sempre acho que estão olhando para o meu anelar de forma discriminadora.

Quanto custa viver, verdadeiramente? Quanto me custaria estar lá, com Antônio, na lagoa? Quanto me custa caminhar com ele pela orla, levá-lo ao parquinho da praça?

Na metade da vida, o desejo de abandonar as ordens de lá de fora e viver e ser feliz. Viver como criança, como Antônio, que sente a mesma alegria se lhe presenteio com um boneco do Ben 10, ou com uma régua geométrica, ou com um bilhetinho dizendo “Te amo!”, ou com um abraço numa hora inesperada...

Para viver para “lá fora”, eu trabalho o dobro do que deveria. Mal vejo meu filho. E de nada adiantará preparar um futuro “mais confortável” ao lado dele, porque nada me certifica de que estaremos juntos nesse futuro. E, mesmo que estejamos, já não estarei ao lado do meu menino, porque infelizmente sua infância está passando na mesma velocidade com que acelero o carro rumo ao trabalho.

Há cinco anos completei quarenta anos, e desde então estendi minhas mãos para o tempo. “Eis-me aqui!”, suplico todos os dias, implorando por um pouco mais de vida – de tempo de vida – porque Antônio não tem culpa se eu decidi ser mãe aos trinta e sete. Olho a vida agora e invejo a época em que tinha dezoito. Quero voltar, não há mais como. Queria estar com dezoito anos agora, para correr atrás de Antônio, para ser perseguida por ele, para ter juventude e energia o suficiente para acompanhá-lo. Vou querer ter os mesmos dezoito anos quando ele tiver também essa idade, para entender as suas dores da adolescência e ter, naquele vocabulário esquisito que se tem aos dezoito anos, a palavra certa para lhe fazer sorrir quando a tristeza vier lhe importunar.

Viver custa caro demais, demais! E a gente vai se entregando às exigências cada vez mais fúteis da vida sem se dar conta de que abrimos mão daquilo que nos é mais importante: o amor verdadeiro. A família, os amigos, nossos animais de estimação, o bem ao próximo.

Feliz de quem aprendeu a negar os apelos imundos do mundo ainda em tempo de viver bem. Feliz de quem se despede de todos os dias da sua vida, com a mesma alegria com que os recebe. Não estamos nós, todos os dias, morrendo um pouquinho?

Imaginando um Antônio que chegará ao meu portão com bochechas avermelhadas que emolduram e embelezam – e eternizam! – ainda mais o seu sorriso, desejo que a mensagem deste texto de hoje penetre no coração do seu leitor como semente. Semente de uma vida melhor. De uma vida que caiba no bolso de todos aqueles que veem prioridade e relevância naquilo que lhes é mais sagrado – cada um tem a sua – daquilo que, justamente por isto, o mundo só quer afastar.

Quanto mais a gente paga para viver, mais se afasta do que é a vida. Está na hora de vivermos o gratuito: o sentimento, a acolhida, o fim de tarde, o nascer do sol, o plantio, a colheita, o sorriso, o afago, a palavra, a ajuda, o perdão, o afeto. Por isto não se paga nada. E só por isto se vem ao mundo. Só por isto se custa viver.

4 comentários:

  1. Minha amiga Karla Pontes, hoje aos 52 anos me sinto na idade do viço...rrsrssrs.....amo viver quero chegar a idade da minha bisa 98 anos....nessa vida passamos por faces...sinceramente por tudo que já passei me sinto realizada aos 52 anos mas penso que ainda tenho muito o que fazer por aqui.....ajudar muita gente principalmente minha filhas, família e amigos. Trabalhamos, trabalhamos, mas nunca se esqueça de aproveitar a vida de viver e ser feliz a cada dia, temos que procurar pela felicidade a cada final de semana de trabalho...isso eu já aprendi.
    Isso tudo não tem preço.....tem sim muito AMOR.....a cada ação seja ela no trabalho, na família ou outra situação foi feito tudo com AMOR e isso não tem preço AMIGA Karla Pontes!!!
    Parabéns belo texto!!!

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    1. Ah, amiga Nícia!... E com quantos anos será que se aprende tudo? Obrigada pelas lindas palavras!!!

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  2. Sempre....falando a coisa super certa na hora totalmente certa....saudades e preces por vcs dois..compartilho das contas,kkkkkkkkkkkk e de como tenho passado pouco tempo com ele....:(

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    1. Rs. Que bom ver você por aqui! Saudades! Obrigada pelo carinho. As preces são bem-vindas!!! :)

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